segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Os teus olhos azuis ainda brilham na minha memória!

Querida Avó Dinorah,

Escrevo-te porque tenho muitas saudades tuas!
Passaram cinco anos e não me habituo à tua ausência.

Muita coisa mudou desde que nos deixaste. A Tia mudou de casa. A tua, agora, está vazia. Lá só habitam as tuas memórias... e as do Avô! Vazia de pessoas… mas cheia de boas e doces recordações.
A Dores está bem. Apesar dos seus noventa e tal, continua por cá, a partilhar a nossa vida como se tivesse nascido na nossa família. Desde os vinte que está ao teu lado, e continua a estar. Os olhos brilham quando se lembra de ti… “a minha Senhora”.
O Tio deixou-nos e, agora, está aí com vocês. Com muita mágoa minha, não chegou a conhecer o mais recente elemento da família. Sim, tens mais uma bisneta. Linda e ‘pespineta’. Ias gostar de a conhecer. Dizem que é tal e qual a Mãe (de feitio, claro, porque de cara é igual ao Pai). Gosta de trepar para cima das coisas e tem tendência para o disparate. Costumavas dizer com algum orgulho: “esta minha neta mais nova é meia maluca”!
Os teus filhos estão óptimos. Graças a Deus! O Pai e a Tia fazem questão de, cada vez que se fala de ti, fazer notar a falta que lhes fazes! Mas não é só a eles… às netas também!
A Avó J continua na maior. Os quase noventa não pesam! Falamos muitas vezes de ti e ela faz sempre questão de me dizer o quanto gostava de ti e a fantástica pessoa que tu eras. É a minha última Avó. Quando for para ao pé de ti… bem… não quero pensar nisso!
Falemos de coisas boas. A terceira bisneta (a F) está óptima e crescida. Graças à minha insistência, nunca se esqueceu de ti. A mais pequena, a quarta bisneta, adora brincar com a girafa que ofereceste à mais velha num Natal. Insiste em chamar-lhe cavalinho, e eu digo-lhe sempre: “foi a tua bisavô que ofereceu à mana. Nunca a conheceste, mas ela gosta muito de ti, e está lá em cima numa estrelinha a olhar para ti”. Adora os avós e faz-me muito lembrar a relação que eu tinha com vocês. À Bisavó J - que ela adora - chama-lhe entusiasticamente ‘vójinha’.
A casa das Azenhas do Mar também já não é nossa. Custa-me tanto passar lá à porta… mas sempre que o faço, me lembro de coisas boas. Recordas-te certamente das minhas fugas de casa para subir aos postes de alta tensão e as minhas passeatas por cima dos muros, que tanto irritavam o Sr. António Bernardino. “Ó menina, saía daí, pintei os muros há uma semana. A Senhora veja lá a sua neta, que está a estragar a pintura dos muros… ai estes miúdos!”. E outras aventuras que não vale a pena contar… lol!

Olha… só queria dizer-te que há cinco anos vivi o pior dia da minha vida. Aquele que eu achei que nunca ia acontecer. Aquele pelo qual rezei para que nunca chegasse. Até que um dia, de manhã, o telefone tocou. No mostrador dizia: Pai. “Olha filha, tens de ter calma”, dizia a voz tremida do outro lado. Percebi logo. Não precisei de mais explicações…
Cinco anos depois, ainda me vêm as lágrimas aos olhos quando me lembro da imagem do Pai e da Tia… a olhar para ti… pela última vez. Ainda tens a rosa branca que te dei nesse dia e que, carinhosamente, te coloquei nas tuas doces e suaves mãos?
Ainda me comovo quando penso em ti e no quanto foste importante para a minha formação e para que eu me tornasse na pessoa que sou hoje. Sinto falta de partilhar conversas contigo. Agora, as conversas são unilaterais. Muitas vezes me sento ao teu lado, na pedra da tua última morada, no ‘museu’ onde vives, e falo, falo, falo… sei que me ouves… mas sei que não vais responder! Tu não falas, mas, às vezes, parece-me ouvir a música do teu piano…

Ah… Querida Avó, continuo usar os teus brincos de pérolas, há cinco anos, todos os dias!

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5 Comments:

At 11:23, Blogger Pi said...

Como te compreendo minha amiga, linda. A minha avó partiu há 7 anos (estará por ventura ao lado da tua) e nunca me habituei à sua ausência. De tal forma, que quando acontece qualquer coisa em Espanha pego no telefone para lhe ligar... Assim foi com o Prestige, assim foi com os atentados do 11 de Março, assim foi com o casamento do Principe Felipe, assim é sempre... pois sempre a tenho no pensamento... E por isso ligo... Como se do outro lado alguém me fosse atender... Mas a sua casa também está vazia. Contudo, e felizmente, cheia de boas recordações.

Usufruímos do privilégio de as termos conhecido... E agora as duas lá em cima riem-se, provavelmente, dos nossos muitos disparates.

Adoro-te amiga!

 
At 15:12, Blogger Freckles said...

Compreendo, melhor do que imaginas, as memórias, as lágrimas, a falta que nos faz...
Estou a fazer um esforço para não chorar enquanto leio esta enorme dedicatória, um testemunho de amor que, por achar que eles duram sempre, às vezes não chegamos a dar enquanto cá estão.
Já perdi três e sei o vazio que, até hoje e, creio, para sempre, existe no meu coração de neta, de segunda filha, da mais irreverente criança de que tinham memória, diziam...
Adorei o texto e trouxe-me boas, ainda que distantes, recordações.
Ainda bem que a palavra saudade existe no nosso dicionário, de outra forma não saberia como definir este sentimento de 'prazer masoquista' que é lembrarmo-nos de quem já não podemos ver com os olhos.
Como tu, falo com eles muitas vezes. Sei que não vão responder mas tenho a certeza que ouvem e me protegem como sempre fizeram.
Um beijinho enorme desta, acho que já, amiga (ultrapassados que estão os 'choquezinhos' de feitio, fruto de duas explosivas homónimas)

 
At 15:45, Blogger Sophia said...

Amiga, tu conheces-me há muitos anos e já deves ter adivinhado o quanto este texto me tocou. Também já perdi as avós, os avôs, e por um daqueles golpes cruéis do destino, a minha Mana. Estiveste comigo nesse momento, e nunca me esquecerei do teu abraço. Desde então, já chorei muito no teu ombro...
Também eu falo com os que já lá estão, escrevo-lhes cartas, peço-lhes conselhos, procuro orientação e não há um dia que passe, que não pense que daria qualquer coisa para os ter de volta, para os ouvir e tocar só mais uma vez...Também vou com frequência ao 'museu', para estar perto, falar, falar, relembrar, chorar e contar segredos, como antes...
A mim, a saudade ainda dói demais... talvez ainda não tenha passado tempo suficiente... Imagino-os todos juntos, cada um a olhar pelos seus. Torna as coisas um bocadinho mais fáceis...

Adoro-te!

 
At 13:50, Anonymous Anónimo said...

Comovente. A tua avó lá no alto estará deliciada a ler esta tua carta com os olhos marejados de lágrimas de alegria. Um momento lindo.

 
At 01:39, Blogger José Cavalheiro said...

Olá1
Já por aqui não passava á algum tempo.
Infeliz ou felizmente todos perdemos ente queridos, é assim a vida.
Á muito partiram os meus avô e avó, munha mãe, sentimos saudades uns mais que outros, mas é assim a vida.
Saudades ficam sempre das boas recordações.
Abraços.
Fica bem

 

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